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sexta-feira, agosto 08, 2003

da escrita,*
'roubando' o título de um post ao bicho que escala estantes. Há textos assim, que nos deixam a pensar, que nos fazem escrever, que nos remetem para a partilha. E como o Vincent até queria comentários, resolvi participar:

«Mas, entre os, talvez, cinquenta ou sessenta colegas de trabalho que já tive, fui encontrando aqui e ali os responsáveis pelos algarismos dessa percentagem tão pequena. Foi de um deles, muito mais velho que eu, talvez na casa dos quarenta, que recebi a maior dica para entender a minha escrita.
Já havíamos falado muito sobre essa paixão de escrever, o que gostávamos e não gostávamos, durante muitas horas ao longo de meses. Mas, dessa vez, este homem, que ainda não tinha publicado nenhum livro nem nunca me quis mostrar nada do que já tinha escrito, disse-me assim
- Olha, vou-te dar um conselho. Tens de perceber que para se ser bom escritor tens de seguir esta regra: De fora para dentro- e repetiu- de fora para dentro.
[...]
Quem escreve tem de ser um intérprete do mundo, da sua beleza e fealdade, dos seus tormentos e maravilhas. Deste modo, ao sermos de certo modo um actor que se exprime em páginas, em vez de palco, tela ou ecrã, somos um espelho que absorve as imagens e as envia de volta para os leitores, para dentro dos seus sonhos e realidades, bem acomodados e estruturados.Eu, que provavelmente nunca verei um livro editado com o meu nome na capa, sei isto. Parece-me que, infelizmente, muitos dos autores dos livros que eu vendo, não. Mas aposto que os grandes sabem. E disto gostava de receber comentários.
(Vincent Bengelsdorf)

Caro Vincent,
também eu gostava de saber isso, saber no sentido da expressão, mas nem sempre a necessidade é a de interpretar o mundo e então perdemo-nos em interioridades que se fecham sobre si mesmas. Podia cair na tentação de escrever que a poesia é mais permissiva a isto mas não é verdade. Se calhar, a poesia até é a forma mais 'fácil' de interpretar o mundo quando se consegue encontrar as imagens exactas e perfeitas e há poetas ou poemas onde isso acontece.

Por outro lado, pergunto-me também se o exercício de dentro para fora, do auto-conhecimento, da auto-reflexão, não será igualmente uma forma de revelar o mundo ou partir para o mundo? Quantas vezes já encontrei num elemento, numa paisagem, numa história passada, num quotidiano observado, a imagem perfeita para o que estava a sentir e a tentar escrever? Como se o processo fosse uma simbiose entre o mundo e o eu e não uma relação de sentido unívoco. E até será isto mesmo que o Vincent está a descrever: um escritor deve ser capaz de conseguir construir um mundo onde cada leitor se identifique ou se estranhe, onde cada leitor re-apreenda o que o rodeia através de uma combinação de palavras que se transformam em não-palavras mas imagens tridimensionais - em si, suas e de um outro (do autor) - e assim sempre diferentes, independentemente do ponto de partida. E eu é que levei à letra o «de fora para dentro». Ou não?»

p.s. - Mas leiam o post do Vincent na íntegra que esse é que vale a pena.

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