domingo, outubro 12, 2003
apontamentos sobre ondas de parvoíce*
Apontamento #1 Klepsýdra e o Aviz trouxeram a discussão para a blogosfera, a propósito de um artigo saído recentemente no Público. Há uns meses houve barulho, papéis pelo ar - medida de indignação -, mas logo a poeira assentou, os programas passaram e as escolas, até ao final de Junho de 2003, escolheram os novos manuais de 10.º ano. Parecia que nada se tinha passado e alguém falou do Big Brother, então? Não. Parece-me que a milionésima versão só começou em Setembro e a real análise dos professores sobre os manuais, afinal, data da mesma altura. Em Junho, geralmente, importam mais as editoras e as férias que estão tão próximas que se tornam a própria respiração. Surpreende-me que esta questão do BB chegue só em Outubro, é o que quero dizer com tudo isto, quando as escolas já sabem dos seus manuais desde Junho e que seja necessário um artigo num jornal para que se redescubra o problema, ainda que admita que a notícia possa ser fruto de outras vozes que não têm voz. Não sei se isto é importante, sei que é apenas reflexo do estado da educação em Portugal.
Apontamento #2 Eu até nem costumo falar/ escrever sobre estas coisas, reflexo de mim mesma, perdoem-me de me afastar, paradoxalmente, do reflexo nacional - é que acho que cumpro o meu papel de professora e de educadora. Não sou uma professora (de História) perfeita. Sei-o e pratico-o. Sei que me falta um certo poder de oratória (não sei dizer isto de outra maneira), de prender os miúdos de forma a que se esqueçam do tempo, de contar a História em mil histórias, com mil referências e um brilho nos olhos. Mas sei também que os incentivo a escrever e a ler, que lhes empresto livros, que lhes peço trabalhos extra de escrita ou dramatização, que na passada quinta-feira sugeri aos alunos do 12.º ano que em vez da ficha 5 do manual podiam fazer um conto sobre as famílias burguesas da 2.ª metade do séc. XIX, que no ano passado, assisti a quatro peças de teatro escritas e encenadas por alunos do 9.º ano e que li cerca de oitenta entrevistas imaginadas a Lenine, que há uns anos, na Lixa, fizemos três edições de livrinhos com histórias passadas em Auschwitz, também escritas pelos alunos do 9.º ano e que nunca mais esquecerei o que me ensinou a Maria da Luz, menina de 14, quase 15 anos que lia Borges, Camus, Maria Gabriela Llansol e escrevia (deve ainda escrever) como raros professores o sabem fazer. Entre as minhas imperfeições e o que me idealizo como professora, consigo encontrar um qualquer ponto de conexão* com os alunos e faço por não o desperdiçar.
Apontamento #3 Não sei porque mudaram, há anos, o programa de História do Secundário. Acho que a Europa tornou-se mais urgente ( e todos sabemos como o Ensino tem um papel fundamental na edificação de mentalidades, a tal da consciência europeia) mas é sempre difícil explicar aos alunos porque repetem o programa de História do 3.º ciclo integralmente no Secundário, quando a mudança está apenas na profundidade da análise. E, sim, como diz o Aviz, perdeu-se o carácter narrativo da História, a portuguesa, dada a soluços, integrada (subalternizada?) na História do Mundo Ocidental. Tenta-se compensar isso, aproveitando breves espaços que o cumprimento dos programas nos dá - incentivando à História local, à recolha de testemunhos, à pesquisa - mas parece sempre que sabe a pouco.
Apontamento #4 Não sei se este texto faz sentido, se importa, de qualquer forma aqui fica.
* Erro ortográfico corrigido em 15.10.2003, pelas 01:05. Professora erra. Acho que não é costume meu, detesto mas acontece.
Apontamento #1 Klepsýdra e o Aviz trouxeram a discussão para a blogosfera, a propósito de um artigo saído recentemente no Público. Há uns meses houve barulho, papéis pelo ar - medida de indignação -, mas logo a poeira assentou, os programas passaram e as escolas, até ao final de Junho de 2003, escolheram os novos manuais de 10.º ano. Parecia que nada se tinha passado e alguém falou do Big Brother, então? Não. Parece-me que a milionésima versão só começou em Setembro e a real análise dos professores sobre os manuais, afinal, data da mesma altura. Em Junho, geralmente, importam mais as editoras e as férias que estão tão próximas que se tornam a própria respiração. Surpreende-me que esta questão do BB chegue só em Outubro, é o que quero dizer com tudo isto, quando as escolas já sabem dos seus manuais desde Junho e que seja necessário um artigo num jornal para que se redescubra o problema, ainda que admita que a notícia possa ser fruto de outras vozes que não têm voz. Não sei se isto é importante, sei que é apenas reflexo do estado da educação em Portugal.
Apontamento #2 Eu até nem costumo falar/ escrever sobre estas coisas, reflexo de mim mesma, perdoem-me de me afastar, paradoxalmente, do reflexo nacional - é que acho que cumpro o meu papel de professora e de educadora. Não sou uma professora (de História) perfeita. Sei-o e pratico-o. Sei que me falta um certo poder de oratória (não sei dizer isto de outra maneira), de prender os miúdos de forma a que se esqueçam do tempo, de contar a História em mil histórias, com mil referências e um brilho nos olhos. Mas sei também que os incentivo a escrever e a ler, que lhes empresto livros, que lhes peço trabalhos extra de escrita ou dramatização, que na passada quinta-feira sugeri aos alunos do 12.º ano que em vez da ficha 5 do manual podiam fazer um conto sobre as famílias burguesas da 2.ª metade do séc. XIX, que no ano passado, assisti a quatro peças de teatro escritas e encenadas por alunos do 9.º ano e que li cerca de oitenta entrevistas imaginadas a Lenine, que há uns anos, na Lixa, fizemos três edições de livrinhos com histórias passadas em Auschwitz, também escritas pelos alunos do 9.º ano e que nunca mais esquecerei o que me ensinou a Maria da Luz, menina de 14, quase 15 anos que lia Borges, Camus, Maria Gabriela Llansol e escrevia (deve ainda escrever) como raros professores o sabem fazer. Entre as minhas imperfeições e o que me idealizo como professora, consigo encontrar um qualquer ponto de conexão* com os alunos e faço por não o desperdiçar.
Apontamento #3 Não sei porque mudaram, há anos, o programa de História do Secundário. Acho que a Europa tornou-se mais urgente ( e todos sabemos como o Ensino tem um papel fundamental na edificação de mentalidades, a tal da consciência europeia) mas é sempre difícil explicar aos alunos porque repetem o programa de História do 3.º ciclo integralmente no Secundário, quando a mudança está apenas na profundidade da análise. E, sim, como diz o Aviz, perdeu-se o carácter narrativo da História, a portuguesa, dada a soluços, integrada (subalternizada?) na História do Mundo Ocidental. Tenta-se compensar isso, aproveitando breves espaços que o cumprimento dos programas nos dá - incentivando à História local, à recolha de testemunhos, à pesquisa - mas parece sempre que sabe a pouco.
Apontamento #4 Não sei se este texto faz sentido, se importa, de qualquer forma aqui fica.
* Erro ortográfico corrigido em 15.10.2003, pelas 01:05. Professora erra. Acho que não é costume meu, detesto mas acontece.