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quarta-feira, outubro 15, 2003

PT- Comunicações *
A empresa de sucesso, ou o sucesso da anedota. Chamem-me romântica, chamem-me parva, se quiserem, mas um dia resolvi acreditar que uma empresa só pode permitir considerar-se, e que a considerem, uma empresa de sucesso quando, a par dos números que rasgam os sorrisos dos ceo's (céus, como gosto de gíria que nada revela), tem clientes bem servidos e trata com a dignidade possível (falamos de patronato e isto de prescindir de manajeiros ao fim de tão pouco tempo, 30 anos passam num instante, é difícil) aqueles que com o seu trabalho participam na criação da riqueza. A PT que eu conheço e que todos insistem chamar uma empresa de sucesso, mais, um modelo de sucesso, quando muito, tem os números. É natural que reúna, portanto, as simpatias daqueles que contam.
Devo ser clara, não quero enganar ninguém. Não estou aqui para ser imparcial. Eu não gosto da PT, não gosto mesmo nada. Trabalhei para a PT durante um ano, aliás, assinei um contrato com uma empresa que pertencia a uma empresa que pertencia à PT (normal, não?). Era-me reconhecido o estatuto de colaboradora da PT e não o de trabalhadora da PT, faz diferença. Falo de call centers, a PT tem-nos espalhados por umas quantas cidades do país: 16208 - Serviço de Avarias, 12118 e 118- Serviços Informativos, 120- Chamadas Assistidas,,, esse tipo de coisas.
Tal como o vejo a PT movimenta-se e aumenta-se, também, à custa de um profundo desrespeito pelos seus clientes, assim como pelos seus "colaboradores".
Um cliente que ligue para o Serviço de Avarias procurando saber por que motivo o seu telefone ainda não foi reparado dificilmente terá outra resposta que não a frase padrão prevista para essa situação (sim, parte da formação dada passava pela memorização de frases padrão a impingir ao cliente), provavelmente qualquer coisa como "o seu pedido encontra-se registado e já foi enviado à área técnica. A avaria será reparada com a maior brevidade possível.". É óbvio que ainda há o cliente que pensa que está a ser a gozado e, depois de nos mandar à merda, informa-nos das suas intenções de efectuar uma reclamação. Tanto pior, "diga-me lá onde é que eu posso fazer a reclamação?" e nós, como quem contínua a gozar, "a reclamação terá que ser feita por escrito e enviada para o fax xxxxxxxxx", "eu não quero fax, dê-me antes o número de telefone... o quê, também não tem? e a morada? um apartado?!". Alguns, só depois de conseguirem falar com um supervisor se rendiam à evidência de que "assim não iam lá".
O 118 tem uma base de dados desactualizada e um software fraquinho que não facilita em nada a pesquisa, bem pelo contrário. E não adianta muita conversa, antes de abrir a boca para mais alguma coisa já o operador o enviou para a resposta automática. Se, por acaso, não era esse o número que pretendia só tem que voltar a ligar. O cliente tanto paga pela informação certa como pela errada. Mas mais que isto, o cliente pode chegar a pagar por informação nenhuma. Se por acaso o sistema informático tem uma falha (e não é coisa que não aconteça tão pouco quanto isso), a política é continuar a atender os clientes e informá-los que nesse momento o serviço está indisponível, mas que poderá voltar a tentar mais tarde, naturalmente esta chamada é paga.
Lembro-me que no serviço de avarias a média de tempo por atendimento andava por volta dos dois minutos e meio, no 118 creio que a média anda entre os trinta e os quarenta segundos (sendo que estes quarentas segundos já serão valores reprováveis e a corrigir por parte do operador).
A pontualidade era de tal forma importante que cheguei a preencher um formulário onde me penalizava pelo atraso de um minuto. Descuidei-me a ligar-me à máquina.

No Expresso deste Sábado (2º Caderno- Economia Internacional) li uma notícia que tinha tudo para me fazer rir às lágrimas, não tivesse a perplexidade superado esse estado potencial. Diz que o Serviço de Despertar da PT funciona a partir de Cabo Verde. Parece que os laços que a PT tem naquele país são muito fortes, é o que diz. Há um contrato de gestão local (surpresa...), infra-estruturas e cabos submarinos. Enfim, não me escandaliza despertar a partir de cabo verde, só me dá um pouquinho que pensar, mas não me escandaliza. Depois, diz que a confirmarem-se os resultados que se estão a verificar a PT afirma considerar (parece até que já está a tratar do assunto) a transferência do 118 também para Cabo Verde. E isto sim, já me parece um grande disparate. Estar em Évora a atender o cliente de Lisboa ou Porto já causava constrangimentos. O cliente assume que quem o atende está perfeitamente inserido na sua realidade geográfica e tende a dar referências muito precisas como "não tem registo? oiça, eu explico-lhe, tá a ver a rotunda do marquês, não tá? não? ah, tá em évora... olhe, não sabia." ou "ouça, quem sai da estação de s. vento e sove para a rua de st. catarina... onde?, ébora?!". Depois há as pronúncias cerradas dos Açores, de algumas regiões do norte, eventualmente, até de algum Alentejo. Aconteceu-me um natural de Rabo de Peixe pedir para que o atendesse em Inglês e de facto só assim o consegui perceber. Talvez seja cepticismo injustificado da minha parte, mas não auguro melhorias no serviço.
Diz ainda, no caderno, que o "call center" que a PT pensa criar em Cabo Verde permite uma considerável poupança de custos (outra surpresa...): a hora de trabalho é paga a 2,5 a 3 euros, contra 7 a 8 euros em Portugal.
Seria já demasiada ingenuidade estar para aqui a debater-me com esta ideia de imoralidade que me assalta sempre que oiço falar destas coisas, ali onde se lê "poupança de custos" leio, sem filtro e eufemismo, exploração de mão-de-obra, mas calo-me já com isto que ainda apanho com o carimbo de esquerdista na testa. Mesmo assim, espantam-me muito os números. As minhas contas são, como é óbvio, outras. Na PT que eu conheço fazendo as contas ao ordenado base que eu conheço (a propósito, há pelo menos três anos que esse salário não sofre qualquer actualização), mesmo que lhe acrescente os prémios de assiduidade e de produtividade, o que o operador de call center ronda os 4 euros, ou seja, metade do que é referido (ocorre-me que metade 2,5 é vergonhoso, mas isto já é extrapolação indevida... se calhar).
Tenho ainda que referir a política de renovação de contratos da empresa. Quando chega ao final do contrato o operador recebe uma cartinha informando-o de que a empresa não necessita mais dos seus serviços, pelo que não renovará o contrato. A rescisão tem sido, para muitos, mero pro forma. Ano após ano, na semana seguinte lá estão a assinar de novo contrato boa parte das pessoas que haviam dispensado formalmente. Outro contrato, um novo contrato que permite à empresa limpar-se de rastos indesejados.

Entende-se agora por que não gosto da PT?


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