sexta-feira, julho 23, 2004
cordas*
lá na terra onde cresci havia coisas inesperadas, como sempre as há em todo o lado. uma vez, foi a música. durante várias noites, na igreja de st. maria do castelo, agrupamentos diversos. foi a primeira vez que ouvi uma orquestra sinfónica, o que quer que isso fosse, ou o que dela cabia no pequeno altar. as igrejas, algumas igrejas, têm esta coisa da acústica, que me dizem faz toda a diferença. numa dessas noites prometiam-nos guitarras às mãos de uns prodigiosos italianos. isto do prodígio é metido por mim, quer-me parecer que eram mesmo bons. e tão bons deviam ser os ditos italianos, que na fila da frente da pequena igreja se instalara o mestre.
à hora, lá estava o lacerda (o lacerda era o chefe da divisão sócio-cultural da câmara, era e é. na verdade, nem estou absolutamente segura de que se tratava do lacerda, lá no altar da igreja, naquele dia, mas é muito provável que fosse. não se espere de mim rigor factual.). e então o lacerda começa com esta conversa do tipo estamos muito honrados e blá blá blá, por termos tão proeminente figura e blá blá blá e mais honrados ficaríamos se nos honrasse com um a sua música, se o mestre não se importasse, antes dos italianos, faça-nos lá o jeitinho. levantou-se um velhote à minha frente, acompanhado de uma senhora e, como já na altura não era assim tão parva quanto posso parecer, percebi de que mestre se tratava. lembro-me que naquele momento momento, a meu favor tinha a natural estupidez dos dezasseis anos, ocorreu-me que mais valia deixar o senhor em paz, que, se demorara aquele tempo a levantar-se e a dirigir-se para a cadeirinha que lhe haviam destinado, o mais certo seria que a destreza das mãos lhe falhasse já também. foi porrada, a música que recebi naquele dia, mereci cada vergastada. lembro-me que eram bons, os italianos que vieram a seguir, sim, muito bons... lembro-os muito vagamente. não sei se alguma vez a música voltou a baixar naquela terra, como naquela noite.
lá na terra onde cresci havia coisas inesperadas, como sempre as há em todo o lado. uma vez, foi a música. durante várias noites, na igreja de st. maria do castelo, agrupamentos diversos. foi a primeira vez que ouvi uma orquestra sinfónica, o que quer que isso fosse, ou o que dela cabia no pequeno altar. as igrejas, algumas igrejas, têm esta coisa da acústica, que me dizem faz toda a diferença. numa dessas noites prometiam-nos guitarras às mãos de uns prodigiosos italianos. isto do prodígio é metido por mim, quer-me parecer que eram mesmo bons. e tão bons deviam ser os ditos italianos, que na fila da frente da pequena igreja se instalara o mestre.
à hora, lá estava o lacerda (o lacerda era o chefe da divisão sócio-cultural da câmara, era e é. na verdade, nem estou absolutamente segura de que se tratava do lacerda, lá no altar da igreja, naquele dia, mas é muito provável que fosse. não se espere de mim rigor factual.). e então o lacerda começa com esta conversa do tipo estamos muito honrados e blá blá blá, por termos tão proeminente figura e blá blá blá e mais honrados ficaríamos se nos honrasse com um a sua música, se o mestre não se importasse, antes dos italianos, faça-nos lá o jeitinho. levantou-se um velhote à minha frente, acompanhado de uma senhora e, como já na altura não era assim tão parva quanto posso parecer, percebi de que mestre se tratava. lembro-me que naquele momento momento, a meu favor tinha a natural estupidez dos dezasseis anos, ocorreu-me que mais valia deixar o senhor em paz, que, se demorara aquele tempo a levantar-se e a dirigir-se para a cadeirinha que lhe haviam destinado, o mais certo seria que a destreza das mãos lhe falhasse já também. foi porrada, a música que recebi naquele dia, mereci cada vergastada. lembro-me que eram bons, os italianos que vieram a seguir, sim, muito bons... lembro-os muito vagamente. não sei se alguma vez a música voltou a baixar naquela terra, como naquela noite.