segunda-feira, agosto 16, 2004
Czeslaw Milosz. 1911-2004*
Nem mais
Tenho que dizer um dia
Como mudei de opinião sobre a poesia
E porque hoje me considero um dos
Mercadores e artesãos do Império Nipónico,
Versejadores das ginjeiras em flor,
Dos crisântemos e da lua cheia.
Se eu pudesse descrever as cortesãs de Veneza
Quando no pátio espevitavam o pavão com o vime
E do vestido sedoso, da cinta nacrada,
Debulhar os lânguidos seios,
O vinco avermelhado no ventre,
Vê-las como as via o mestre
Dos galões carregados de ouro, chegados de manhã;
E se também para os pobres ossos delas - sepultados
No cemitério com o portão lambido pelo mar oleoso -
Achasse uma palavra mais sólida do que o seu último pente,
Que no pó debaixo da laje, espera sozinho pela luz,
Então sim, não teria dúvidas. O que pode recolher-se
Da matéria resistente? Nada além da beleza.
Portanto, temos que contentar-nos com as flores da ginjeira,
Os crisântemos e a lua cheia.
Czeslaw Milosz in
Alguns gostam de poesia, Cavalo de Ferro, 2004.
Mais, p.e., aqui, aqui e aqui.
Nem mais
Tenho que dizer um dia
Como mudei de opinião sobre a poesia
E porque hoje me considero um dos
Mercadores e artesãos do Império Nipónico,
Versejadores das ginjeiras em flor,
Dos crisântemos e da lua cheia.
Se eu pudesse descrever as cortesãs de Veneza
Quando no pátio espevitavam o pavão com o vime
E do vestido sedoso, da cinta nacrada,
Debulhar os lânguidos seios,
O vinco avermelhado no ventre,
Vê-las como as via o mestre
Dos galões carregados de ouro, chegados de manhã;
E se também para os pobres ossos delas - sepultados
No cemitério com o portão lambido pelo mar oleoso -
Achasse uma palavra mais sólida do que o seu último pente,
Que no pó debaixo da laje, espera sozinho pela luz,
Então sim, não teria dúvidas. O que pode recolher-se
Da matéria resistente? Nada além da beleza.
Portanto, temos que contentar-nos com as flores da ginjeira,
Os crisântemos e a lua cheia.
Czeslaw Milosz in
Alguns gostam de poesia, Cavalo de Ferro, 2004.
Mais, p.e., aqui, aqui e aqui.