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domingo, janeiro 23, 2005

prenda de Natal para o Mário*

granito

Um poeta pode durar sei lá 80 anos
Há mesmo alguns que duram noventa anos
Por seu turno uma mesa de madeira dessas vulgares
dessas com um tampo de tábua que as boas donas de casa procuram
sem sucesso que fiquem menos rugosas
- e de repente um rasgão de luz o perpassar duma lâmpada
um traço de vela que alguém acendeu no escuro
devolve-lhe o seu perímetro real de pinho decepado
de pobre utensílio ou de superfície usual -
Mas dizíamos nós aí vinte trinta anos
aí uns setenta se for bela usança de uma casa afastada?

Olhei e vi: um muro nem mesmo bem cuidado de
granito
(palavra que contém não apenas o simulacro exterior
de matérias geradas pelo interior da terra
mas também o que se sente ou se adivinha ou que
se desejaria fazer frutificar: e é a mancha
de qualquer líquido por exemplo a água
mas nunca azeite ou vinho ou até mesmo mercúrio
o sólido cruzando o seu contrário
enigma)
apenas pedras sobre pedras naquele campo a anoitecer.

E um arrepio correu-me dos dedos aos olhos.
E nada mais perguntei a mim mesmo.
E nada mais desde esse momento quis saber.
Disse para mim: granito.
Disse para mim: é então este o granito.
E olhei de novo em volta como se de repente

uma emoção anónima terrível singular me tivesse alcançado.


Nicolau Saião

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