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sábado, julho 10, 2004

A Sophia, tudo.*


O mar é liso como um chão e o seu azul é tão azul que parece aceso. E a luz é doirada levíssima e passa rasando as águas naquele Setembro de 1963 que foi o mais belo Outono da Europa

É então que Leukas aparece. A coisa que vejo é tão extraordinária que pergunto a mim própria se não estarei divagando: pois em roda da ilha há um halo azul uma respiração azul um resplendor azul. A sua cor é mais intensa luminosa e mais radiosa do que a cor do céu e mais transparente do que a cor do mar. É como um arco íris todo azul, é como se a ilha projectasse uma sombra radiosa e celeste

Mais tarde um amigo sábio conta-me que este fenómeno que resulta das condições naturais da atmosfera e da luz é um fenómeno típico da paisagem grega cuja singularidade já na antiguidade era motivo de nota e de espanto, pois não se vê em nenhum outro país, senão talvez na Sicília.

Quando desembarco e vou pela estrada ao longo do golfo do Corinto há no ar um cheiro a resina a mel e a fruta. À minha direita loureiro oliveiras e ciprestes.

À minha esquerda estreitas praias cujo solo é feito de pequenas pedras arredondadas e polidas. E do outro lado das águas lisas as montanhas erguem-se junto ao mar, enormes, altíssimas, penetradas duma solenidade que domina todas as coisas.

E em roda dessas montanhas há o mesmo halo que rodeia Leukada e Ítaca. O mesmo resplendor intensamente azul, mais azul do que o céu e mais radioso do que o mar.

........

Quem embarca em Brindisi ao cair da tarde num velho barco chamado Atreus acorda na manhã seguinte em frente das ilhas gregas

Aquilo que então vê excede tudo quanto imaginou e tudo quanto os escritores de viagens contaram

No golfo de Corinto

A respiração dos deuses é visível:

E um halo azul, uma nuvem

Em roda das montanhas e das ilhas

Como um céu mais atento e concentrado

E também o cheiro dos deuses invade as estradas

É um cheiro a resina a mel e a fruta

Onde se desenham grandes corpos lisos e brilhantes

Sem suor, sem lágrimas, sem falha

Sem a menor ruga de tempo

Só em Homero, só no azul espalhado e na indizível felicidade da poesia homérica eu tinha encontrado uma notícia fiel daquilo que depois vi.

Os golfinhos rodeiam o Atreus. Parecem-me mais pequenos que os golfinhos de Portugal e são muito mais mansos. Um deles acompanha-nos durante muito tempo nadando quasi à tona de água.

(Fragmentos nunca publicados referentes à primeira viagem que Sophia fez à Grécia)


Mil Folhas, 10 de Julho de 2004.




Que ninguém perca o Mil Folhas de hoje.
Até a que procuras, lá está. E já enviaram mail à Antena 2,
para pedir repetição de programa da ALC?
Alexandra, tu repetes, para nós?

quinta-feira, julho 08, 2004

eros #11


Luis Buñuel (frame de Un Chien Andalou)


em rigor
as medidas tiram-se de mãos
nas nalgas

as mãos
geladas em reconhecimento
nervoso


cláudia caetano

quarta-feira, julho 07, 2004

Sophia por ALC na Antena 2*

Uma evocação de Sophia foi feita ontem, na Antena 2, por Alexandra Lucas Coelho. Usem o mail da RDP e peçam à direcção da RDP para repetir numa hora menos confidencial.Usem o mail antena2@rdp.pt

segunda-feira, julho 05, 2004

'o silêncio principia como um animal'*


Pia Tafdrup


Entre o sempre e o nunca

Entre o sempre e o nunca
é que as coisas acontecem
um segundo sem fôlego
quando menos se espera
o mundo transforma-se

afundado em si prórpio
sete corações abaixo
é que de repente se imagina
uma época em que as pedras
começam a sangrar.


Dá-me chuva

Dá-me chuva
como mãos vivas
ou passa-me
o instante
na ponta de um faca
eu fico aberta.


Água em chamas

[...]
Tem de haver água para haver vida,
e os homens precisam de banhos demorados...
ensaboo-te e enxaguo-te de novo, o teu corpo torna-se pesado,
não és só um homem mas todos os homens.[...]


Pia Tafdrup, Ponto de Focagem do Oceano,
Lisboa, Quetzal Editores, 2004, Trad. colectiva (Mateus, Junho 2002)
revista, completada e apresentada por Laureano Silveira.

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