sábado, maio 22, 2004
dualidades mínimas #46
a roupa tira-se com o vagar de quem come
em frente à televisão— anule-se qualquer ideia de desejo
o quarto está vazio
cláudia caetano
a roupa tira-se com o vagar de quem come
em frente à televisão— anule-se qualquer ideia de desejo
o quarto está vazio
cláudia caetano
quinta-feira, maio 20, 2004
o possível*
[...] As pernas doíam-me e sentei-me no sofá, sentei-me e pensei que era esse o sítio em que menor probabilidade haveria de ser avistado desde o exterior, pensei também que essa hipótese não estava de todo eliminada e impus ao tronco e ao pescoço e à cabeça uma posição rígida, impus-me uma postura tensa e vigilante, suponho que é assim que se diz, embora eu nada vigiasse. Nada vigio agora, pensei, deixei de ser o observador e tornei-me a coisa observada, pelo menos tornei-me a coisa observada em potência e isto basta para me inquietar, talvez me inquiete mais do que saber-me observador, as possibilidades sempre me incomodaram mais que as ocorrências, não posso permanecer nesta posição de animal preso numa armadilha, tenho de escapar desta armadilha em que me deixei apanhar, vou erguer-me do sofá, vou erguer-me tão rígido como se continuasse sentado, quero dizer quase tão rígido, não posso estar sentado e levantar-me e manter-me tão rígido como se continuasse sentado, alguma parte do meu corpo terá de se flexibilizar, a começar pelas pernas, talvez isto signifique que o movimento flexibiliza os corpos, ou talvez não signifique nada, eu é que tenho este defeito racionalista de procurar sempre uma conclusão, vou então erguer-me e avançar com passos seguros, devo relaxar o corpo antes de me erguer, devo relaxá-lo para que o movimento resulte firme e harmonioso, sinto o corpo todo endurecido, apenas o sexo se conserva mole, vou relaxar o corpo antes de me erguer, então avançarei com passos seguros até ao interruptor eléctrico e desligarei a luz num movimento firme e harmonioso, desligarei a luz e regressarei do estatuto de coisa observada ao estatuto de observador, pelo menos regressarei ao estatuto de observador em potência e isto há-de bastar-me, afinal o possível sempre me interessou mais do que o efectivo. [...]
João Paulo Sousa, Os Enganos da Alma,
Quasi, 2002.
[...] As pernas doíam-me e sentei-me no sofá, sentei-me e pensei que era esse o sítio em que menor probabilidade haveria de ser avistado desde o exterior, pensei também que essa hipótese não estava de todo eliminada e impus ao tronco e ao pescoço e à cabeça uma posição rígida, impus-me uma postura tensa e vigilante, suponho que é assim que se diz, embora eu nada vigiasse. Nada vigio agora, pensei, deixei de ser o observador e tornei-me a coisa observada, pelo menos tornei-me a coisa observada em potência e isto basta para me inquietar, talvez me inquiete mais do que saber-me observador, as possibilidades sempre me incomodaram mais que as ocorrências, não posso permanecer nesta posição de animal preso numa armadilha, tenho de escapar desta armadilha em que me deixei apanhar, vou erguer-me do sofá, vou erguer-me tão rígido como se continuasse sentado, quero dizer quase tão rígido, não posso estar sentado e levantar-me e manter-me tão rígido como se continuasse sentado, alguma parte do meu corpo terá de se flexibilizar, a começar pelas pernas, talvez isto signifique que o movimento flexibiliza os corpos, ou talvez não signifique nada, eu é que tenho este defeito racionalista de procurar sempre uma conclusão, vou então erguer-me e avançar com passos seguros, devo relaxar o corpo antes de me erguer, devo relaxá-lo para que o movimento resulte firme e harmonioso, sinto o corpo todo endurecido, apenas o sexo se conserva mole, vou relaxar o corpo antes de me erguer, então avançarei com passos seguros até ao interruptor eléctrico e desligarei a luz num movimento firme e harmonioso, desligarei a luz e regressarei do estatuto de coisa observada ao estatuto de observador, pelo menos regressarei ao estatuto de observador em potência e isto há-de bastar-me, afinal o possível sempre me interessou mais do que o efectivo. [...]
João Paulo Sousa, Os Enganos da Alma,
Quasi, 2002.
quarta-feira, maio 19, 2004
imagias #21
Coneyl Jay, The Future of Nanotechnology
querer-te a ponto de acreditar que cada célula
em mim avança para cada célula em ti
— de que outra coisa se fará o reconhecimento
e um dispositivo fantástico bem nas tuas entranhas
trabalhando a meu favor
estruturando uma nova disposição do amor
cláudia caetano
Coneyl Jay, The Future of Nanotechnology
querer-te a ponto de acreditar que cada célula
em mim avança para cada célula em ti
— de que outra coisa se fará o reconhecimento
e um dispositivo fantástico bem nas tuas entranhas
trabalhando a meu favor
estruturando uma nova disposição do amor
cláudia caetano
segunda-feira, maio 17, 2004
mudanças [actualização]*
só nos links: reformulações e inclusões.
As Musas Esqueléticas
B. LOGO ESCREVO
conversas de xaxa
Don Vivo
imbricações
Kafka sumiu em Belo Horizonte
laranja amarga
miniscente
Os Espelhos Velados
Prazer_Inculto
rain song
There's Only Alice
Para o bem e para o mal, template mantém-se.
só nos links: reformulações e inclusões.
As Musas Esqueléticas
B. LOGO ESCREVO
conversas de xaxa
Don Vivo
imbricações
Kafka sumiu em Belo Horizonte
laranja amarga
miniscente
Os Espelhos Velados
Prazer_Inculto
rain song
There's Only Alice
Para o bem e para o mal, template mantém-se.
por vezes*
Por vezes, precisávamos que tudo fosse simples
– as folhas das árvores rindo tocadas pelo vento,
uma mangueira de água a fixar o pó à terra,
as portas das casas fechadas na ausência –
que tudo fosse simples como as mortes necessárias
Sandra Costa
Por vezes, precisávamos que tudo fosse simples
– as folhas das árvores rindo tocadas pelo vento,
uma mangueira de água a fixar o pó à terra,
as portas das casas fechadas na ausência –
que tudo fosse simples como as mortes necessárias
Sandra Costa
quase no fim*
Não imagino outra forma
de dizer o amor senão usando
o que sobra de luz quando as tardes
terminam: são de sombras vagas
todos os versos que te escrevo.
Sandra Costa
Não imagino outra forma
de dizer o amor senão usando
o que sobra de luz quando as tardes
terminam: são de sombras vagas
todos os versos que te escrevo.
Sandra Costa
domingo, maio 16, 2004
dualidades mínimas #45
e o sol fez-se forte e luminoso
para lá da surpresa e do brilho
os olhos cerraram-se de dor
cláudia caetano
e o sol fez-se forte e luminoso
para lá da surpresa e do brilho
os olhos cerraram-se de dor
cláudia caetano