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sábado, outubro 18, 2003

»~«*
onde a noite não chega e os
pássaros não cegam de amor e de fumo negro

onde a terra é preta e as flores
são viçosas de luz e de verde

onde os poemas não fogem como os gatos vadios
rondando furtivos as mercearias

onde as minhas mãos não hesitam no vidro
e sustêm seguras as fragilidades do mundo


sexta-feira, outubro 17, 2003

sillylittlething*

Numa conversa gorda de interesses a meio da tarde, o solícito G. levou-me de Takeshi Kitano a David Lynch, rascunhou no paint (do windows) um mapa de Montemor-o-Novo assinalando a Fonte de Letras e o Cine-Teatro, de Tim Burton a Lars Von Trier. Falávamos dos desenhinhos do sr. Burton, quando se lembrou "há uma boneca engraçada... lenore... ofereci um livro à  minha irmã... é de um gajo, pá, como é o nome? [google] ah, é isto, roman dirge".

É terrí­vel, em alguns momentos cruel, noutros só violento. não vejam, não queiram ver. Não é coisa para pessoa séria.



Por algum estranho motivo lembro-me desta menina.


quinta-feira, outubro 16, 2003

fly me to the moon #5


Estas coisas acontecem-me... ia a subir a rua e a rapariga ia descer, sorria e enquanto oferecia aquele sorriso surpreendente (ou ainda que não oferecesse, era claro que não se incomodava com a apropriação que o mundo fazia dele) passou a mão pela cabelo como quem acena. Só isso, mais nada. Smiling & Waving e fui para cima a trautear the diver. Já há algum tempo que não a oiço, quando chegar a casa vou tratar desse assunto.




The diver

Standing
High above us all
At the edge of
The diving board

Smiling and waving
Before letting himself fall
The faintest splash
As the water engulfed him
It was beautiful to watch
So beautiful to watch

He was propably
The world's best diver
Probably
The world's best diver
He was
The world's
Best
Diver
Probably

Touching the bottom
He pushed away
With both legs

And cut through the surface
Like a fish

The faintest splash
As the water engulfed him
It was beautiful to watch
So beautiful to watch

I stay high above

He was
The world's
Best diver

But he could not swim

It was beautiful to watch
So beautiful to watch


quarta-feira, outubro 15, 2003

PT- Comunicações *
A empresa de sucesso, ou o sucesso da anedota. Chamem-me romântica, chamem-me parva, se quiserem, mas um dia resolvi acreditar que uma empresa só pode permitir considerar-se, e que a considerem, uma empresa de sucesso quando, a par dos números que rasgam os sorrisos dos ceo's (céus, como gosto de gíria que nada revela), tem clientes bem servidos e trata com a dignidade possível (falamos de patronato e isto de prescindir de manajeiros ao fim de tão pouco tempo, 30 anos passam num instante, é difícil) aqueles que com o seu trabalho participam na criação da riqueza. A PT que eu conheço e que todos insistem chamar uma empresa de sucesso, mais, um modelo de sucesso, quando muito, tem os números. É natural que reúna, portanto, as simpatias daqueles que contam.
Devo ser clara, não quero enganar ninguém. Não estou aqui para ser imparcial. Eu não gosto da PT, não gosto mesmo nada. Trabalhei para a PT durante um ano, aliás, assinei um contrato com uma empresa que pertencia a uma empresa que pertencia à PT (normal, não?). Era-me reconhecido o estatuto de colaboradora da PT e não o de trabalhadora da PT, faz diferença. Falo de call centers, a PT tem-nos espalhados por umas quantas cidades do país: 16208 - Serviço de Avarias, 12118 e 118- Serviços Informativos, 120- Chamadas Assistidas,,, esse tipo de coisas.
Tal como o vejo a PT movimenta-se e aumenta-se, também, à custa de um profundo desrespeito pelos seus clientes, assim como pelos seus "colaboradores".
Um cliente que ligue para o Serviço de Avarias procurando saber por que motivo o seu telefone ainda não foi reparado dificilmente terá outra resposta que não a frase padrão prevista para essa situação (sim, parte da formação dada passava pela memorização de frases padrão a impingir ao cliente), provavelmente qualquer coisa como "o seu pedido encontra-se registado e já foi enviado à área técnica. A avaria será reparada com a maior brevidade possível.". É óbvio que ainda há o cliente que pensa que está a ser a gozado e, depois de nos mandar à merda, informa-nos das suas intenções de efectuar uma reclamação. Tanto pior, "diga-me lá onde é que eu posso fazer a reclamação?" e nós, como quem contínua a gozar, "a reclamação terá que ser feita por escrito e enviada para o fax xxxxxxxxx", "eu não quero fax, dê-me antes o número de telefone... o quê, também não tem? e a morada? um apartado?!". Alguns, só depois de conseguirem falar com um supervisor se rendiam à evidência de que "assim não iam lá".
O 118 tem uma base de dados desactualizada e um software fraquinho que não facilita em nada a pesquisa, bem pelo contrário. E não adianta muita conversa, antes de abrir a boca para mais alguma coisa já o operador o enviou para a resposta automática. Se, por acaso, não era esse o número que pretendia só tem que voltar a ligar. O cliente tanto paga pela informação certa como pela errada. Mas mais que isto, o cliente pode chegar a pagar por informação nenhuma. Se por acaso o sistema informático tem uma falha (e não é coisa que não aconteça tão pouco quanto isso), a política é continuar a atender os clientes e informá-los que nesse momento o serviço está indisponível, mas que poderá voltar a tentar mais tarde, naturalmente esta chamada é paga.
Lembro-me que no serviço de avarias a média de tempo por atendimento andava por volta dos dois minutos e meio, no 118 creio que a média anda entre os trinta e os quarenta segundos (sendo que estes quarentas segundos já serão valores reprováveis e a corrigir por parte do operador).
A pontualidade era de tal forma importante que cheguei a preencher um formulário onde me penalizava pelo atraso de um minuto. Descuidei-me a ligar-me à máquina.

No Expresso deste Sábado (2º Caderno- Economia Internacional) li uma notícia que tinha tudo para me fazer rir às lágrimas, não tivesse a perplexidade superado esse estado potencial. Diz que o Serviço de Despertar da PT funciona a partir de Cabo Verde. Parece que os laços que a PT tem naquele país são muito fortes, é o que diz. Há um contrato de gestão local (surpresa...), infra-estruturas e cabos submarinos. Enfim, não me escandaliza despertar a partir de cabo verde, só me dá um pouquinho que pensar, mas não me escandaliza. Depois, diz que a confirmarem-se os resultados que se estão a verificar a PT afirma considerar (parece até que já está a tratar do assunto) a transferência do 118 também para Cabo Verde. E isto sim, já me parece um grande disparate. Estar em Évora a atender o cliente de Lisboa ou Porto já causava constrangimentos. O cliente assume que quem o atende está perfeitamente inserido na sua realidade geográfica e tende a dar referências muito precisas como "não tem registo? oiça, eu explico-lhe, tá a ver a rotunda do marquês, não tá? não? ah, tá em évora... olhe, não sabia." ou "ouça, quem sai da estação de s. vento e sove para a rua de st. catarina... onde?, ébora?!". Depois há as pronúncias cerradas dos Açores, de algumas regiões do norte, eventualmente, até de algum Alentejo. Aconteceu-me um natural de Rabo de Peixe pedir para que o atendesse em Inglês e de facto só assim o consegui perceber. Talvez seja cepticismo injustificado da minha parte, mas não auguro melhorias no serviço.
Diz ainda, no caderno, que o "call center" que a PT pensa criar em Cabo Verde permite uma considerável poupança de custos (outra surpresa...): a hora de trabalho é paga a 2,5 a 3 euros, contra 7 a 8 euros em Portugal.
Seria já demasiada ingenuidade estar para aqui a debater-me com esta ideia de imoralidade que me assalta sempre que oiço falar destas coisas, ali onde se lê "poupança de custos" leio, sem filtro e eufemismo, exploração de mão-de-obra, mas calo-me já com isto que ainda apanho com o carimbo de esquerdista na testa. Mesmo assim, espantam-me muito os números. As minhas contas são, como é óbvio, outras. Na PT que eu conheço fazendo as contas ao ordenado base que eu conheço (a propósito, há pelo menos três anos que esse salário não sofre qualquer actualização), mesmo que lhe acrescente os prémios de assiduidade e de produtividade, o que o operador de call center ronda os 4 euros, ou seja, metade do que é referido (ocorre-me que metade 2,5 é vergonhoso, mas isto já é extrapolação indevida... se calhar).
Tenho ainda que referir a política de renovação de contratos da empresa. Quando chega ao final do contrato o operador recebe uma cartinha informando-o de que a empresa não necessita mais dos seus serviços, pelo que não renovará o contrato. A rescisão tem sido, para muitos, mero pro forma. Ano após ano, na semana seguinte lá estão a assinar de novo contrato boa parte das pessoas que haviam dispensado formalmente. Outro contrato, um novo contrato que permite à empresa limpar-se de rastos indesejados.

Entende-se agora por que não gosto da PT?


terça-feira, outubro 14, 2003

Re:*


esta não sou eu. é isto tantas vezes.
nos reflexos turvos das impressões dos outros espelho nenhum. esta não sou eu.
não eu no nervosismo com estranhos, não eu nos dias mare(j)ados, não eu no desconforto das vozes.
tenho um relógio que teima em atrasar quando vem para o meu pulso. tenho uma bicicleta de vinte e tantas velocidades que quase não uso. tenho um só anel, de lata. perdi a aliança de ouro e platina que o meu pai ofecerecera à minha mãe, depois disso nunca mais me emprestaram ou confiaram jóias. tenho os óculos empenados, depois me esquecer deles na cama e de lhes pôr o joelho esquerdo em cima, enquanto me esquecia de mim num beijo - dizem que beijo bem. vejo francamente mal do olho esquerdo. sou dextra. não conduzo muito. tenho as noites mal dormidas, tenho os dedos muito tortos, apesar disso, não diria feias as minhas mãos, tanto mais que me livrei da verruga que tinha na base do polegar. em criança usei calçado ortopédico, ainda hoje não são muito certos os pés, denunciam-me todas as solas de sapatos.
faço de conta que não me importo. importo-me quase sempre. lambo feridas todos os dias, não para que sarem, mas para que não sequem nunca.
há dias de muito medo, mas do que gosto mesmo é dos dias de muito vento.


segunda-feira, outubro 13, 2003

desatenções*
Estava eu aqui com a Beth Gibbons e Mazzy Star a embalar-me, a escrever sobre fomento e obras públicas, a senda do progresso, modelos económicos, atrasos estruturais e dependências externas, contradições oitocentistas que Fontes não conseguiu resolver por bom augúrio que o seu nome anunciasse quando me aparece a D. Fernanda pelo pseudo-escritório dentro com os seus oitenta anos, corpo de luto e voz de menina, e me pergunta se eu ainda não tinha olhado pela janela. Que não propriamente. Que só as árvores no contraste com o cinzento, mas percebi a intenção e levantei-me. E lá estavam todos. Padre, entidades camarárias, ilustres personagens da freguesia, a senhora do avental entre as senhoras dos aventais, a freirinha porque parece que o padre convocou na missa de domingo, os carros e os camiões e as placas de desvio dispostas em círculo, como que ainda viciadas pelo ar da manhã. Eis a inauguração das obras para instalação do saneamento básico em S. Mamede de Coronado. Diz a D. Fernanda que às 11 horas é em S. Romão. E eu ainda me espanto com as minhas desatenções. De não saber da inauguração. E de me dedicar à História e ter que falar aos alunos do fomento português do séc. XIX. Vou aos papéis e confirmo: sim, séc. XIX. A D. Fernanda já vai descendo e também me confirma: quer dizer, se eu não viesse cá cima nem davas por nada, sandrinha. Pois não, só quando caísse num dos buracos...

Re:*
eu sou a das sombras e do sol a que usa a linguagem dos pássaros a um canto da janela como se esse fosse o fio invisível que nos prende ao chão e não nos permite voar a que abrevia fórmulas de entender o mundo sem nada saber de física e matemática a que não aguenta a imensidão um anjo às costas de costas voltadas para o futuro e assim explode em danças estáticas no princípio de um claustro a que tem dificuldades em convocar narradores para as palavras e as liberta sem pudor a que gosta de chuva sendo a do sol a que em certas noites de verão se enrodilha de desejo sendo a das sombras

eu sou a que me persegue e tudo fica por dizer dizendo tudo

domingo, outubro 12, 2003

post*
para quem gosta de inventários e escreve outubro outono.

Outubro diz
que o mundo rodopia disfarçadamente como as folhas
que os regressos são invenções como os poetas que partem
que os espelhos intactos não cabem num verso como o eco das esperas ainda que os jardins suspensos
que as borboletas estão fora de prazo como o ritmo cardíaco do que deixo por escrever
que a chuva cai sobre os poemas sem guarda-chuva como o meu amor por ti.

há poemas que dizem que hoje é domingo*

Há poemas que dizem que hoje é domingo
e que chove também. Há poemas onde o tempo está encostado à minha janela
e que soam a jardins abandonados
ou à minha voz perdida em jardins abandonados. Há poemas que permanecem na minha respiração mesmo depois
quando me esqueço de mim

há poemas.

apontamentos sobre ondas de parvoíce*

Apontamento #1 Klepsýdra e o Aviz trouxeram a discussão para a blogosfera, a propósito de um artigo saí­do recentemente no Público. Há uns meses houve barulho, papéis pelo ar - medida de indignação -, mas logo a poeira assentou, os programas passaram e as escolas, até ao final de Junho de 2003, escolheram os novos manuais de 10.º ano. Parecia que nada se tinha passado e alguém falou do Big Brother, então? Não. Parece-me que a milionésima versão só começou em Setembro e a real análise dos professores sobre os manuais, afinal, data da mesma altura. Em Junho, geralmente, importam mais as editoras e as férias que estão tão próximas que se tornam a própria respiração. Surpreende-me que esta questão do BB chegue só em Outubro, é o que quero dizer com tudo isto, quando as escolas já sabem dos seus manuais desde Junho e que seja necessário um artigo num jornal para que se redescubra o problema, ainda que admita que a notí­cia possa ser fruto de outras vozes que não têm voz. Não sei se isto é importante, sei que é apenas reflexo do estado da educação em Portugal.

Apontamento #2 Eu até nem costumo falar/ escrever sobre estas coisas, reflexo de mim mesma, perdoem-me de me afastar, paradoxalmente, do reflexo nacional - é que acho que cumpro o meu papel de professora e de educadora. Não sou uma professora (de História) perfeita. Sei-o e pratico-o. Sei que me falta um certo poder de oratória (não sei dizer isto de outra maneira), de prender os miúdos de forma a que se esqueçam do tempo, de contar a História em mil histórias, com mil referências e um brilho nos olhos. Mas sei também que os incentivo a escrever e a ler, que lhes empresto livros, que lhes peço trabalhos extra de escrita ou dramatização, que na passada quinta-feira sugeri aos alunos do 12.º ano que em vez da ficha 5 do manual podiam fazer um conto sobre as famí­lias burguesas da 2.ª metade do séc. XIX, que no ano passado, assisti a quatro peças de teatro escritas e encenadas por alunos do 9.º ano e que li cerca de oitenta entrevistas imaginadas a Lenine, que há uns anos, na Lixa, fizemos três edições de livrinhos com histórias passadas em Auschwitz, também escritas pelos alunos do 9.º ano e que nunca mais esquecerei o que me ensinou a Maria da Luz, menina de 14, quase 15 anos que lia Borges, Camus, Maria Gabriela Llansol e escrevia (deve ainda escrever) como raros professores o sabem fazer. Entre as minhas imperfeições e o que me idealizo como professora, consigo encontrar um qualquer ponto de conexão* com os alunos e faço por não o desperdiçar.

Apontamento #3 Não sei porque mudaram, há anos, o programa de História do Secundário. Acho que a Europa tornou-se mais urgente ( e todos sabemos como o Ensino tem um papel fundamental na edificação de mentalidades, a tal da consciência europeia) mas é sempre difí­cil explicar aos alunos porque repetem o programa de História do 3.º ciclo integralmente no Secundário, quando a mudança está apenas na profundidade da análise. E, sim, como diz o Aviz, perdeu-se o carácter narrativo da História, a portuguesa, dada a soluços, integrada (subalternizada?) na História do Mundo Ocidental. Tenta-se compensar isso, aproveitando breves espaços que o cumprimento dos programas nos dá - incentivando à História local, à recolha de testemunhos, à pesquisa - mas parece sempre que sabe a pouco.

Apontamento #4 Não sei se este texto faz sentido, se importa, de qualquer forma aqui fica.

* Erro ortográfico corrigido em 15.10.2003, pelas 01:05. Professora erra. Acho que não é costume meu, detesto mas acontece.

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